A Eternidade dos 90 Anos: Celebre a Vida e a Poesia Inimitável de Adélia Prado

A Eternidade dos 90 Anos: Celebre a Vida e a Poesia Inimitável de Adélia Prado
Neste sábado, o Brasil e o mundo da literatura se voltam para Divinópolis, Minas Gerais, para celebrar um marco na vida de uma das maiores vozes da poesia contemporânea: Adélia Prado. Aos 90 anos, a escritora mineira continua a nos encantar com sua voracidade desconcertante e luminosa, capaz de transformar o cotidiano e o sagrado em versos inesquecíveis. Sua obra, que estreou com “Bagagem” em 1976, com o icônico verso “Mulher é desdobrável / Eu sou”, permanece tão relevante e pungente quanto na primeira leitura.
Adélia Prado: A Mestra das Palavras Vivas
O desejo de Adélia Prado, expresso em “Palavras, quero-as antes como coisas”, revela a profundidade de sua relação com a linguagem. Para ela, as palavras não são meros veículos, mas entidades palpáveis, capazes de carregar a essência da vida. A chegada aos 90 anos, para a poeta, é um estado de pura gratidão. “Nunca me imaginei fazendo 90 anos. Mas, quando chega, você percebe que não é nenhum bicho-papão! Estou em estado de gratidão pela vida!”, confidenciou a veículos de imprensa, demonstrando a leveza e a sabedoria que a caracterizam.
Conheça mais sobre a trajetória de Adélia Prado em sua página na Wikipédia e aprofunde-se em sua importância para a literatura brasileira no Itaú Cultural.
“O Jardim das Oliveiras”: Um Novo Capítulo em 90 Anos
E como presente de aniversário para seus leitores, Adélia Prado nos brinda com “O Jardim das Oliveiras”, seu primeiro livro de inéditos em doze anos. Este lançamento é um evento literário que reacende a chama de sua criação, mostrando que a inspiração e a capacidade de inovar permanecem intactas. A obra já está sendo aclamada e explorada por críticos, adicionando mais um tesouro ao seu já vasto legado.
A Imortalidade da Obra de Adélia Prado
A produção de Adélia Prado é uma tapeçaria rica e complexa, que tece o divino com o humano, o prosaico com o sublime. Desde seus primeiros poemas até os mais recentes, ela consegue traduzir o indizível, tocar o “coração da gente – o escuro, escuros”, como ela mesma faz referência a Guimarães Rosa. Sua poesia é uma oração, uma meditação sobre a existência, o amor e o tempo.
- Versos que Assombram: Desde “Bagagem”, Adélia nos convida a uma introspecção profunda.
- Reflexões Sobre a Vida: Em obras como “O Pelicano”, ela aborda temas como o envelhecimento e a passagem do tempo com singularidade.
- A Força Feminina: Adélia Prado é frequentemente celebrada como a poeta do “futuro feminino”, explorando a mulher em suas múltiplas facetas.
“Tenho 18 Anos. Incompletos”: A Juventude Eterna da Alma
Uma das frases mais icônicas de Adélia, “Sob juramento lhes digo: tenho 18 anos. Incompletos”, sintetiza sua visão sobre a vida e a passagem do tempo. A idade cronológica pode avançar, mas a alma, em sua essência, mantém uma vitalidade perene. Este sentimento é magistralmente capturado no poema que ela própria escolheu para marcar seu aniversário:
Estou alegre e o motivo beira secretamente à humilhação, porque aos 50 anos não posso mais fazer curso de dança, escolher profissão, aprender a nadar como se deve. No entanto, não sei se é por causa das águas, deste ar que desentoca do chão as formigas aladas, ou se é por causa dele que volta e põe tudo arcaico como a matéria da alma, se você vai ao pasto, se você olha o céu, aquelas frutinhas travosas, aquela estrelinha nova, sabe que nada mudou. O pai está vivo e tosse, a mãe pragueja sem raiva na cozinha. Assim que escurecer vou namorar. Que mundo ordenado e bom! Namorar quem? Minha alma nasceu desposada com um marido invisível. Quando ele fala roreja, quando ele vem eu sei, porque as hastes se inclinam. Eu fico tão atenta que adormeço a cada ano mais. Sob juramento lhes digo: tenho 18 anos. Incompletos.
Este poema, de “O Pelicano” (1987), é um testemunho da capacidade de Adélia Prado de encontrar a continuidade e a beleza naquilo que parece transitório. A vida, em suas pequenas grandezas, permanece inalterada em sua essência mais profunda.
O Amor em Versos: Sofrimento, Ouro e Jardim
A complexidade dos sentimentos humanos, especialmente o amor, é outra pedra angular na poesia de Adélia. Ela não o idealiza, mas o mostra em sua crueza e seu poder transformador. Considere o seguinte fragmento:
Assim que se é posto à prova,
na cinza do óbvio, quando
atrás de um caminhão vazando
o homem que pediu sua mão
informa:
‘está transportando líquido’.
Podes virar santa se, em silêncio,
pões de modo gentil a mão no joelho dele
ou a rainha do inferno se invectivas:
claro, se está pingando,
querias que transportasse o quê?
Amar é sofrimento de decantação,
produz ouro em pepitas, elixires de longa vida,
nasce de seu acre a árvore da juventude perpétua.
É como cuidar de um jardim,
quase imoral deleitar-se
com o cheiro forte do esterco, um cheiro ruim meio bom,
como disse o menino quanto a porquinhos no chiqueiro.
É mais que violento o amor.
Nesses versos, Adélia Prado desvela a dualidade do amor: a beleza que nasce do incômodo, a santidade e a fúria que coexistem. É uma visão realista, profunda, que ressoa com a experiência humana em sua totalidade, utilizando metáforas vívidas e surpreendentes.
Celebre Adélia Prado: Uma Leitura Essencial
Celebrar os 90 anos de Adélia Prado é mergulhar em uma obra que é um farol na literatura brasileira. Sua capacidade de nos assombrar com a beleza do real, do sagrado e do cotidiano, faz dela uma escritora essencial. Convidamos você a explorar seus livros, redescobrir seus poemas e deixar-se tocar pela profundidade e a leveza de uma mente que continua a florescer. Que a poesia de Adélia Prado continue a inspirar gerações, provando que as “palavras, quando coisas”, são eternas.
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