O Legado Inquietante de Ângela Diniz: Marjorie Estiano Desvenda um Brasil Que Ainda Luta Pela Liberdade Feminina

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O Legado Inquietante de Ângela Diniz: Marjorie Estiano Desvenda um Brasil Que Ainda Luta Pela Liberdade Feminina
Quase meio século separa o trágico feminicídio de Ângela Diniz do Brasil de hoje. Em 2025, enquanto revisitamos sua história, é impossível não notar que, apesar de avanços legais e sociais significativos, a violência contra mulheres ainda é uma realidade alarmante. Essa profunda reflexão guiou a atriz Marjorie Estiano em seu papel na minissérie Ângela Diniz: Assassinada e Condenada, recém-lançada na HBO Max.
Um Mergulho Profundo no Passado e no Presente
A série nos transporta para o Brasil dos anos 1970, apresentando a socialite mineira Ângela Diniz, uma mulher à frente de seu tempo que ousou desafiar as rígidas normas sociais da época. Seu “crime”? Desejar ser tão livre quanto os homens, uma audácia que culminou em sua morte. Em 30 de dezembro de 1976, Ângela foi brutalmente assassinada com quatro tiros pelo empresário Doca Street, em Búzios – um caso que chocou o país e se tornou um marco na história do feminicídio no Brasil.
Para Marjorie Estiano, mergulhar na pele de Ângela foi mais do que um desafio artístico; foi uma jornada psicanalítica. “Ângela viveu num tempo em que ser livre custava caro. Hoje, ainda custa”, observa a atriz. Sua imersão na personagem a fez confrontar a persistência do patriarcado na sociedade e em si mesma, revelando como muitos comportamentos são naturalizados dentro desse sistema. Não é à toa que Marjorie tem se destacado em papéis que evidenciam as angústias de gênero e do cenário brasileiro, como em Sob Pressão e Fim, indicando uma sensibilidade especial para esses temas complexos.
A Luta Continua: Feminismo e Legado de Ângela Diniz
A história de Ângela Diniz serve como um doloroso lembrete do longo caminho percorrido e do quanto ainda precisamos avançar. Embora marcos civis como a Lei Maria da Penha (2006) e a Lei do Feminicídio (2015) tenham sido cruciais, o Brasil ainda figura entre os países com maior índice de feminicídios. Marjorie Estiano ressalta: “O feminicídio é só a ponta do iceberg. As violências acontecem desde o nascimento. As vítimas que denunciam abusos ou assédio são absolutamente achincalhadas, descredibilizadas.”
Um dos pilares para a construção da minissérie foi o aclamado podcast Praia dos Ossos, da Rádio Novelo. A produção desvendou não apenas a vida de Ângela, mas também a vergonhosa estratégia de defesa de Doca Street, que, no primeiro julgamento em 1979, alegou “legítima defesa da honra”. Essa tese desumanizadora, que culpava a vítima por seu estilo de vida “libertino”, quase garantiu sua absolvição e gerou revolta nacional. Foi a força do movimento feminista, com o icônico slogan “Quem Ama Não Mata”, que exigiu a reabertura do caso, resultando na condenação de Doca em 1981 e impulsionando a conscientização sobre as relações abusivas.
A atriz enfatiza a importância do feminismo: “Nesse estudo, entendi ainda mais o valor do movimento feminista, das transgressões e das lutas das mulheres nos seus diversos âmbitos.” Nomes como Simone de Beauvoir, Lélia Gonzalez e Djamila Ribeiro foram fundamentais para a sua compreensão do contexto e da evolução do pensamento feminista.
Ângela, a Mulher Complexa e o Espelho de uma Época
Construir a personagem Ângela Diniz foi um desafio, dada a escassez de registros sobre sua própria voz. As memórias existentes são, em sua maioria, de terceiros – muitas vezes refletindo o preconceito da época. A série, no entanto, não glamoriza nem simplifica Ângela. Pelo contrário, faz uma escolha consciente e corajosa de apresentar suas complexidades, incluindo comportamentos racistas e seu inicial rechaço ao feminismo. Marjorie e a equipe buscam espelhar a sociedade da década de 1970, com suas ausências e preconceitos.
Mais do que uma mulher em busca de liberdade, a série revela Ângela como uma mãe amorosa e um farol para outras mulheres ricas que, inspiradas por ela, desejavam ser donas de suas próprias vidas. Em um Brasil que, em 2025, ainda enfrenta retrocessos e recordes de violência de gênero, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, revisitar a história de Ângela Diniz é um ato de resistência e um chamado à ação. “Quero que a série seja absorvida não só como uma história do passado, mas como motivação para que seja melhor ainda”, anseia Marjorie Estiano, esperando que a narrativa inspire as novas gerações a lutar por mais direitos, liberdade, proteção e educação.
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