Refit em Xeque: Operação Poço de Lobato Desmascara a Maior Fraude Tributária do Brasil

Refit em Xeque: Operação Poço de Lobato Desmascara a Maior Fraude Tributária do Brasil
O Brasil foi palco de uma das maiores e mais complexas operações contra crimes fiscais e lavagem de dinheiro. Sob o codinome “Poço de Lobato”, uma força-tarefa implacável desvendou um esquema bilionário encabeçado pelo Grupo Refit, apontado como o maior devedor de impostos de São Paulo e um dos maiores do país. Uma rede intrincada de fraudes em combustíveis, evasão de ICMS e ocultação de bens foi exposta, gerando um prejuízo estimado em R$ 26 bilhões aos cofres públicos.
Esta operação, que movimentou centenas de agentes em cinco estados e no Distrito Federal, não é apenas um marco na luta contra a sonegação, mas também um alerta sobre a sofisticação das organizações criminosas no ambiente de negócios brasileiro.
O Gigante da Sonegação: Quem é o Grupo Refit?
No centro deste escândalo está o Grupo Refit, comandado pelo empresário Ricardo Magro. Com forte atuação no setor de combustíveis, incluindo a antiga refinaria de Manguinhos, no Rio de Janeiro, a empresa acumulou um histórico impressionante de débitos fiscais. O grupo detém o título de maior devedor de ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) no estado de São Paulo, o segundo maior no Rio de Janeiro e um dos maiores em nível federal. A dívida astronômica reflete anos de práticas ilícitas que agora vêm à tona.
Operação Poço de Lobato: O Desdobramento da Ação
A manhã do dia 27 de novembro de 2025 marcou o início de uma ofensiva coordenada para cumprir mandados de busca e apreensão contra 190 alvos. Suspeitos de integrar uma organização criminosa, esses indivíduos são acusados de crimes contra a ordem econômica e tributária, além de lavagem de dinheiro. A operação não visou apenas os líderes do Grupo Refit, mas toda uma teia de colaboradores que sustentava o esquema.
Um Prejuízo Bilionário: Os Números da Fraude
Os investigadores calculam que o esquema causou um rombo de R$ 26 bilhões aos cofres estaduais e federais. Para mitigar parte desse prejuízo, o Comitê Interinstitucional de Recuperação de Ativos do Estado de São Paulo (Cira-SP) conseguiu o bloqueio judicial de R$ 8,9 bilhões. Paralelamente, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional assegurou a indisponibilidade de R$ 1,2 bilhão adicionais da organização criminosa.
O Intricado Esquema: Como a Refit Operava
A complexidade da fraude do Grupo Refit é um dos pontos mais chocantes da investigação. Similar a outras grandes operações, como a “Carbono Oculto”, foi detectado o uso estratégico de fintechs e fundos de investimento para movimentar e ocultar o dinheiro ilícito. Em setembro anterior à operação, a Receita Federal e a Agência Nacional do Petróleo (ANP) já haviam interditado a Refit e apreendido navios com combustível importado irregularmente da Rússia, um sinal do que estava por vir.
O Caminho do Dinheiro Ilícito: Fintechs, Fundos e Offshores
A rede de fraudes se estendia por:
- Rede de Colaboradores: Pessoas e empresas que agiam como fachada.
- Holdings e Offshores: Entidades criadas para dissimular a propriedade e origem dos recursos.
- Meios de Pagamento e Fundos de Investimento: Instrumentos utilizados para lavar o dinheiro, conferindo-lhe uma aparência de legalidade e dificultando o rastreamento.
A Receita Federal identificou 17 fundos ligados ao grupo, totalizando um patrimônio líquido de R$ 8 bilhões. A maioria era de fundos fechados, com um único cotista, geralmente outro fundo, criando camadas de ocultação. Há fortes indícios de que administradoras de fundos colaboraram ativamente, omitindo informações cruciais.
A investigação também revelou a participação de entidades estrangeiras como sócias e cotistas, muitas delas constituídas em Delaware, nos Estados Unidos. Essa jurisdição é conhecida por permitir a criação de empresas do tipo LLC com anonimato e isenção tributária local, desde que não gerem renda em território norte-americano, tornando-se um paraíso para estratégias de lavagem de dinheiro e blindagem patrimonial.
Uma das principais operações internacionais envolveu a aquisição de uma exportadora em Houston, Texas, de onde foram importados mais de R$ 12,5 bilhões em combustíveis entre 2020 e 2025. Mais de 15 offshores nos EUA foram identificadas, remetendo cerca de R$ 1 bilhão para aquisição de participações e imóveis no Brasil. Além disso, foram detectados envios ao exterior de mais de R$ 1,2 bilhão por meio de contratos de mútuo conversíveis em ações, permitindo o retorno dos recursos ao Brasil como “investimentos” via outras offshores, fechando o ciclo da lavagem.
“A Operação Poço de Lobato é um exemplo contundente da complexidade e da audácia das organizações criminosas que atuam no Brasil, explorando brechas e estruturas financeiras sofisticadas para lesar o Estado.”
A Força-Tarefa: Uma Coalizão Contra o Crime
A amplitude da operação demonstra a união de esforços de diversas instituições. Um total de 621 agentes públicos, incluindo promotores de Justiça, auditores fiscais da Receita Federal e das secretarias da Fazenda de São Paulo (municipal e estadual), além de policiais civis e militares, estiveram mobilizados. A ação foi deflagrada pelo Cira-SP e contou com a participação fundamental da Receita Federal do Brasil, Ministério Público de São Paulo, Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de SP, Secretaria Municipal de Fazenda de SP, Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional e Procuradoria-Geral do Estado de SP.
Os mandados foram cumpridos nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia, Maranhão e no Distrito Federal, evidenciando a capilaridade da rede criminosa e a coordenação necessária para desmantelá-la.
O Legado da Fraude e o Futuro da Fiscalização
A Operação Poço de Lobato representa um avanço significativo na fiscalização e combate às fraudes tributárias de grande porte. O desmantelamento de um esquema tão elaborado, que utilizava modernas ferramentas financeiras e jurídicas, envia uma mensagem clara: o Estado brasileiro está aprimorando seus mecanismos para identificar e punir quem tenta se esquivar das responsabilidades fiscais. A saga do Grupo Refit e de Ricardo Magro serve como um estudo de caso sobre os desafios persistentes da conformidade fiscal e a importância da vigilância contínua para proteger o patrimônio público.
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