A Teia Luxuosa: Polícia Federal Desvenda Esquema Clandestino de Medicamentos Emagrecedores Ligado à Unikka Pharma

Uma operação da Polícia Federal lançou luz sobre um intrincado e luxuoso esquema de fabricação e comercialização clandestina de medicamentos emagrecedores, com a Unikka Pharma sendo um dos nomes centrais na investigação. Revelados em detalhes impactantes, os bastidores dessa rede envolvem desde um médico influenciador com centenas de milhares de seguidores até clínicas em endereços nobres e uma ilha paradisíaca na Bahia.

Luxo e Poder: O Delinear da Fraude Médica

As investigações apontam para uma estrutura sofisticada que subvertia as regras de manipulação de medicamentos. No cerne, a substância Tirzepatida – princípio ativo de um dos mais vendidos tratamentos para obesidade e diabetes globalmente, o Mounjaro. Embora a manipulação individual por farmácias especializadas seja permitida no Brasil para ajustes de dose, a PF descobriu um cenário de produção em larga escala, sem identificação de pacientes e em quantidades massivas, fugindo completamente das normas da Anvisa.

“Você nunca vai esperar chegar em uma farmácia de manipulação e encontrar grandes quantidades em estoque, produtos manipulados sem o nome do paciente, produtos manipulados em escala de milhares”, destaca a perita criminal federal Diana Neves, evidenciando a dimensão da irregularidade.

O Influenciador no Centro da Tempestade: Dr. Gabriel Almeida

Um dos alvos principais da Operação era o médico baiano Gabriel Almeida. Com uma forte presença digital – mais de 750 mil seguidores nas redes sociais – ele é conhecido por seus conteúdos sobre tratamento da obesidade, apresentando-se como escritor, palestrante e empresário. Sua rotina, que incluía deslocamentos em jatinho particular, contrastava com a seriedade das acusações.

Almeida prescrevia a Tirzepatida, e as investigações sugerem que ele e outros médicos seriam sócios ocultos do laboratório que produzia as ampolas apreendidas.

Unikka Pharma: O Elos Clandestino da Produção em Massa?

A sede do Laboratório Unikka Pharma, localizada na Zona Sul de São Paulo, foi um dos locais de cumprimento de mandados de busca e apreensão. Segundo a Polícia Federal, era nesse laboratório que as ampolas de Tirzepatida apreendidas eram produzidas e manipuladas, em ambientes irregulares para tal escala. Além da Tirzepatida, foram encontrados e apreendidos anabolizantes e implantes hormonais, todos manipulados em condições que não atendiam às exigências sanitárias.

A dimensão da operação se estendeu a 24 mandados de busca e apreensão em casas, clínicas e laboratórios com ligações ao Dr. Gabriel Almeida e outros médicos envolvidos, demonstrando a capilaridade do esquema.

A Ilha Paradisíaca: Mais que Um Refúgio, Um Centro de “Treinamento”

Um dos símbolos do luxo revelado pela Operação é a Ilha de Carapituba, na Baía de Todos os Santos, adquirida em consórcio pelo médico Gabriel Almeida. Longe de ser apenas um refúgio, a ilha milionária, a cerca de 40 minutos de barco de Salvador, era, de acordo com a PF, utilizada como um centro de treinamento. Médicos de todo o Brasil participavam de cursos sobre o “Protocolo de Emagrecimento” nessa ilha paradisíaca.

“A Ilha funcionava não apenas como um centro de estudos, mas também a apresentação dos produtos para que fossem vendidos para clínicas e laboratórios”, explicou o delegado da Polícia Federal, Fabrízio Galli, ressaltando o papel estratégico do local no esquema.

O Que Dizem os Envolvidos e as Autoridades

O advogado de Gabriel Almeida afirmou que o médico possui pós-graduações na área, reconhecidas pelo MEC, embora não seja endocrinologista. Ele negou a responsabilidade de seu cliente pela fabricação dos medicamentos, sua participação na Unikka Pharma como sócio oculto, ou qualquer vínculo além de ser um “consumidor dos produtos” do laboratório. Já a Unikka Pharma, em nota, defendeu-se alegando que “não fabricou ou fabrica, não comercializa e nunca comercializou o que ilusoriamente se intitulou ‘falso Mounjaro’”, e que atende “exclusivamente clínicas e profissionais médicos legalmente habilitados, jamais fazendo venda ao público geral ou varejo.”

A Anvisa, por sua vez, confirmou ter prestado apoio técnico na identificação dos produtos, mas ressaltou que a investigação segue sob sigilo judicial e que informações adicionais cabem à Polícia Federal.

A Importância da Fiscalização para a Saúde Pública

Este caso sublinha a criticidade da fiscalização em um setor tão sensível quanto o da saúde. A manipulação de medicamentos exige rigor e respeito às normativas para garantir a segurança e eficácia para os pacientes. A Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e outras entidades médicas frequentemente alertam sobre os riscos de tratamentos e substâncias não regulamentadas.

A operação da PF, ao desmantelar essa rede de luxo e ilegalidade, reafirma o compromisso com a proteção da saúde pública, alertando para os perigos de esquemas que colocam em risco a vida dos consumidores em busca de resultados rápidos e, muitas vezes, milagrosos.