Fim do Voto na Prisão? Câmara Endurece Leis e Debate o Futuro Eleitoral de Detentos

Fim do Voto na Prisão? Câmara Endurece Leis e Debate o Futuro Eleitoral de Detentos
A Câmara dos Deputados movimentou o cenário legislativo brasileiro ao aprovar um projeto de lei que promete ser um divisor de águas no combate ao crime organizado e, surpreendentemente, no debate sobre se preso pode votar. O texto, que agora segue para o Senado Federal, não só endurece as penas para quem faz parte de organizações criminosas e milícias, mas também traz uma polêmica emenda sobre os direitos eleitorais de detentos provisórios.
A aprovação, com 370 votos favoráveis, marca um momento de intensos debates e discordâncias entre governistas e o relator, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), que classificou a proposta original do Executivo como “fraca” e defendeu as alterações que, segundo ele, são um “marco legal do combate ao crime organizado”. Mas o que exatamente muda e qual o impacto para os direitos políticos dos cidadãos?
Um Novo Marco Contra o Crime Organizado: Penas e Restrições Mais Severas
O Projeto de Lei 5582/25, na versão aprovada, introduz o conceito de “domínio social estruturado”, uma tipificação para diversas condutas praticadas por organizações criminosas e milícias privadas. As penas previstas são duríssimas, variando de 20 a 40 anos de reclusão para o domínio e de 12 a 20 anos para o favorecimento a esse domínio.
Entre as principais mudanças, destacam-se:
- Apreensão Prévia de Bens: Possibilidade de confisco de bens do investigado antes mesmo do trânsito em julgado.
- Restrições para Condenados: Proibição de anistia, graça, indulto, fiança ou liberdade condicional para crimes previstos no projeto.
- Auxílio-Reclusão: Dependentes não terão direito ao benefício se o segurado estiver preso provisoriamente ou cumprindo pena por qualquer crime listado no PL.
- Regime de Segurança Máxima: Líderes de facções, milícias ou grupos paramilitares serão obrigatoriamente alocados em presídios federais de segurança máxima.
- Agravantes: Circunstâncias como liderança na organização, financiamento de atividades criminosas, uso de armas restritas, envolvimento de crianças/adolescentes e conexão internacional elevam as penas.
O texto também endurece as regras de progressão de pena para crimes hediondos, aumentando o tempo de cumprimento em regime fechado. Para réus primários, passa de 40% para 70%; para reincidentes, de 60% para 80%. Em casos de reincidência e morte da vítima, o percentual salta para 85%.
A Grande Questão: Afinal, Preso Pode Votar?
A emenda mais discutida, e que gerou a maior controvérsia, foi proposta pelo deputado Marcel van Hattem (Novo-RS). Ela proíbe o alistamento eleitoral de quem está em prisão provisória e cancela o título de eleitor daqueles que já o possuíam. A justificativa do parlamentar é clara: “Não faz sentido o cidadão estar afastado da sociedade, mas poder decidir os rumos da política”.
Historicamente, a legislação eleitoral brasileira permite que presos provisórios (aqueles que ainda não têm condenação transitada em julgado) possam votar. A ideia por trás disso é que a presunção de inocência deve ser mantida, e o direito ao voto só seria suspenso com uma sentença final condenatória. A emenda aprovada na Câmara, portanto, representa uma ruptura significativa com essa tradição e levanta questionamentos profundos sobre os direitos civis.
Líderes de partidos de oposição criticaram veementemente a proposta, argumentando que ela atenta contra princípios constitucionais e pode abrir precedentes perigosos. O debate se estendeu, com deputados mencionando até mesmo casos de figuras políticas com prisão provisória, evidenciando a polarização do tema.
Outras Alterações e o Caminho Para o Senado
Além das medidas contra o crime organizado e a polêmica do voto, o projeto inclui outras previsões importantes:
- Responsabilidade Corporativa: Suspende o CNPJ de empresas envolvidas em receptação de produtos de crime e impede administradores reincidentes de exercer o comércio por cinco anos.
- Prazo de Inquérito: Define prazos de 30 dias para inquéritos com indiciado preso e 90 dias para solto, ambos prorrogáveis.
- Crimes Hediondos: Reafirma a natureza hedionda dos novos crimes de domínio social estruturado e seus favorecimentos, garantindo a aplicação das restrições da Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/90).
O texto agora segue para o Senado, onde deverá enfrentar novos rounds de discussão e, possivelmente, mais alterações. A questão do direito ao voto dos presos provisórios, em particular, promete gerar um intenso debate jurídico e político, testando os limites da separação de poderes e dos direitos fundamentais.
A sociedade brasileira acompanhará de perto essa tramitação, ciente de que as decisões tomadas impactarão não apenas o sistema penal, mas a própria concepção de cidadania no país.
Compartilhar:


