
Trump e a Ascensão da “AI Slop”: A Estética Digital da Política no X

Trump e a Ascensão da “AI Slop”: A Estética Digital da Política no X
O ex-presidente Donald Trump encontrou uma estética peculiar para marcar sua presença digital, especialmente na plataforma X (anteriormente Twitter): a chamada “AI Slop” (algo como “mingau/restolho de IA”). Nos últimos tempos, sua administração e contas afiliadas têm inundado as redes sociais com um volume sem precedentes de mídias geradas ou alteradas por Inteligência Artificial, criando um universo visual que é, ao mesmo tempo, bizarro e estrategicamente calculado.
O Que é a “AI Slop” de Trump?
Essa estética digital é caracterizada por imagens e vídeos criados de forma impulsiva, muitas vezes grotescos e com baixo esforço aparente. É o oposto da arte tradicional que busca refinamento e processo. No contexto de Trump, a “AI Slop” parece ser o meio artístico perfeito para sua marca política: rápida, chocante e frequentemente desafiadora da realidade. Essa fascinação não é totalmente nova, remontando a retuítes de memes criados por apoiadores no passado, mas a IA leva a capacidade de gerar conteúdo visualmente distorcido a um novo nível.
A IA permite a criação de cenários e representações que simplesmente não existiriam de outra forma, uma ferramenta particularmente útil para uma figura política que mantém uma relação, digamos, complicada com os fatos. Desde imagens de Trump salvando gatos (após comentários polêmicos sobre imigrantes) até a promoção de criptomoedas e visões de Gaza como um cassino, a “AI Slop” tem sido usada de forma esporádica.
O Fim de Semana da “AI Slop”: Do Papa a Jedi
Recentemente, no entanto, o uso da “AI Slop” atingiu um novo patamar. Um fim de semana específico viu pelo menos sete peças de mídia gerada ou alterada por IA serem postadas. Isso incluiu:
- Uma imagem foto-realista de Trump como Papa, postada em sua conta Truth Social e repostada no X pela Casa Branca. Essa imagem gerou forte reação da Igreja Católica, com um bispo americano considerando-a “profundamente ofensiva”, especialmente no contexto pós-morte de um Papa e da expectativa por um novo líder.
- No dia 4 de maio (conhecido pelos fãs como Star Wars Day), a conta oficial da Casa Branca no X publicou uma imagem gerada por IA de um Trump musculoso empunhando um sabre de luz vermelho (associado aos vilões Sith) e flanqueado por águias americanas. A legenda misturava referências a Star Wars com ataques a oponentes políticos, ironicamente chamando-os de “Império” (quando Trump empunhava a arma Sith).
- Contas afiliadas, como a DOD Rapid Response e a U.S. Army Pacific Command, também entraram na onda, postando vídeos com rolagens de texto estilo Star Wars sobre as “conquistas” de Trump e imagens de soldados com sabres de luz no lugar de armas.
Esses exemplos mostram um padrão: apropriar-se de elementos da cultura popular (seja religião, cinema ou internet) e pervertê-los ou utilizá-los de forma que choque e provoque reações.
Por Que “AI Slop” é a Estética MAGA?
Assim como movimentos políticos históricos tiveram suas estéticas artísticas (pense na propaganda soviética ou na arte nazista), o movimento MAGA parece ter encontrado na “AI Slop” sua expressão visual ideal. No entanto, ao contrário de estéticas que buscavam convencer ou informar, a “AI Slop” de Trump parece ter outro objetivo:
- Provocação: Chocar e irritar aqueles que não apoiam o movimento.
- Engajamento da Base: Excitar e entreter os apoiadores justamente pela capacidade de ofender os oponentes e zombar de elementos considerados “sagrados” por outros.
A estratégia é clara: se você ama algo – Star Wars, a Lofi Girl, Studio Ghibli, a Igreja Católica – Trump, através de sua mídia digital, parece determinado a pervertê-lo. Nada é intocável; objetos sagrados e arte amada existem para serem “desacreditados” ou usados de forma controversa. A IA torna esse ato de “profanação digital” tão fácil quanto apertar um botão.
AI Slop: Um Ataque Bruto à Realidade e à Arte
O uso constante de “AI Slop” reflete um ataque mais amplo. É um ataque bruto aos algoritmos que moldam nossa percepção online e, por extensão, um ataque à própria realidade e à noção de verdade. A forma como a IA gera imagens – sem um processo criativo, apenas gratificação instantânea – ecoa a abordagem política de Trump, frequentemente descrita como um “ataque de força bruta” (brute force attack): uma enxurrada de ações (decretos, cortes, ataques a instituições) que buscam sobrecarregar sistemas e adversários.
O caso da imagem gerada por IA de uma mulher sendo presa pelo ICE, transformada em caricatura para zombaria online, ilustra de forma sombria essa estratégia. Uma pessoa real, em uma situação real, teve sua imagem apropriada e distorcida para servir a uma narrativa política, convidando o escárnio digital.
Enquanto a arte tradicional valoriza o processo, a reflexão e a intenção por trás da criação, a “AI Slop” de Trump celebra a impulsividade e a realização imediata de qualquer fantasia, por mais grotesca ou vingativa que seja. Ela não apenas desrespeita os artistas e as obras originais, mas também desvaloriza a própria ideia de criação com propósito e significado.
Em última análise, a “AI Slop” de Donald Trump no X e em outras plataformas não é apenas uma tendência estética passageira. É uma manifestação digital de uma estratégia política que busca chocar, sobrecarregar e redefinir a realidade através de um fluxo constante de conteúdo visualmente impactante, porém vazio de substância ou respeito pela arte e pela verdade.
(Nota: Este artigo analisa o uso de mídia digital gerada por IA no contexto político e não endossa ou refuta posições políticas.)
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