
Drex e a reviravolta na blockchain: O futuro do Real Digital mudou?

O Drex, projeto ambicioso do Banco Central para criar o Real Digital, era sinônimo de uma revolução baseada em blockchain. No entanto, uma mudança de rota surpreendeu o mercado: a tecnologia de registro distribuído (DLT), pilar do projeto, foi colocada em segundo plano. Mas isso significa o fim do sonho de um sistema financeiro tokenizado no Brasil? Calma, a história é mais complexa e pragmática do que parece.
A grande mudança de planos: Adeus (por enquanto) à blockchain complexa
O plano original era ousado: construir toda a infraestrutura do Drex sobre uma rede blockchain permissionada, a Hyperledger Besu. Isso permitiria a criação de dinheiro programável, crédito direto entre pessoas e uma infinidade de operações financeiras inovadoras. Contudo, o Banco Central (BC) anunciou uma guinada estratégica.
Em vez de mergulhar de cabeça na complexidade da DLT, o foco agora será mais modesto e imediato: criar, até 2026, uma solução para reconciliação de gravames. Em termos simples, o objetivo é facilitar o uso de diferentes tipos de bens como garantia para operações de crédito, garantindo que todos os sistemas envolvidos “conversem” entre si de forma eficiente.
Por que a mudança? O desafio da privacidade na blockchain
Um dos maiores obstáculos encontrados pelo BC foi garantir a privacidade das transações dentro da rede Hyperledger Besu sem sacrificar a “programabilidade” — a capacidade de criar contratos inteligentes que executam operações automaticamente. Segundo Fabio Araujo, coordenador do Drex no BC, as soluções de privacidade testadas até agora, embora boas, ainda não estão maduras o suficiente para servirem de base para todo o sistema financeiro nacional.
- Desafio Técnico: Implementar uma solução de privacidade robusta na Hyperledger Besu se mostrou mais difícil do que o esperado.
- Necessidade de Testes: As ferramentas existentes precisam de mais desenvolvimento e adaptação para o nível de segurança exigido por um CBDC (Moeda Digital de Banco Central).
- Foco no Curto Prazo: O BC optou por entregar um serviço útil à população (facilitação de crédito) em um prazo menor, enquanto a tecnologia DLT amadurece.
Marcos Sarres, CEO da GoLedger, admitiu que a tecnologia Besu talvez não tenha sido a ideal para os requisitos do projeto, citando outras opções como a Hyperledger Fabric (já usada pela Receita Federal) que poderiam oferecer mais escalabilidade e privacidade nativas.
E o futuro da tokenização e do Drex?
A decisão do Banco Central não significa o abandono da tokenização ou da visão de longo prazo para o Drex. Pelo contrário, foi vista por grandes players do mercado como uma medida “pragmática e acertada”.
“A decisão do BC de fasear a implementação do projeto é pragmática e acertada. Mantém o projeto e a visão de longo prazo, mas divide a iniciativa em fases, de forma a atingir os objetivos à medida que a tecnologia ganha maturidade.”
André Portilho, chefe de ativos digitais do BTG Pactual.
Bancos como BTG Pactual, Inter e a própria Febraban (Federação Brasileira de Bancos) reforçaram seu compromisso com o projeto e com o avanço da tokenização no país. O aprendizado obtido nos testes até agora não foi perdido e continuará sendo aplicado em outras iniciativas de inovação.
Conclusão: Um passo para trás para dar dois à frente
A reviravolta no projeto Drex não é um retrocesso, mas sim um ajuste de curso estratégico. Ao priorizar uma entrega de valor mais rápida e tangível — a otimização do mercado de crédito —, o Banco Central ganha tempo para que a tecnologia blockchain amadureça e possa ser implementada com a segurança e a eficiência que uma economia do tamanho do Brasil exige.
O futuro do dinheiro continua digital e programável. A mudança no Drex apenas mostra que a jornada para essa nova realidade será construída com passos firmes e calculados, em vez de um salto único e arriscado. A revolução do Real Digital não foi cancelada, apenas dividida em capítulos mais realistas.
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